Comentários - Debate Sílvia Franco
Alessandra Carreira
Bom dia a todos!
Obrigada, Sílvia, por sua apresentação, que nos deu a oportunidade de circular por questões ainda bastante novas para o Lalíngua, mas que não deixam de tocar nas questões que vêem nos afetando nos últimos tempos em nossas discussões teóricas e clínicas.
Estamos às voltas, sobretudo, com o que é uma comunidade analítica orientada pelo ensino e pela clínica introduzidos por Lacan na psicanálise. Sem dúvida nenhuma pensar no final de análise e no dispositivo do passe faz parte dessa discussão sobre o começo e a manutenção ou não de uma comunidade como essa, afinal o fim diz sobre o começo e vice-versa.
Nos preparativos para esse encontro de hoje, Sílvia pediu à comissão organizadora que houvesse, após a sua apresentação, alguém encarregado de comentar um pouco suas considerações e dar início a uma discussão. A comissão dirigiu-se a mim, perguntando se eu poderia me encarregar disso. Como vêem, eu topei.
Gostaria, então, de começar dizendo que, para mim, isso tudo aconteceu bem depressa, não deu tempo de pensar. Depois de aceito o convite, veio a surpresa, surpresa essa causada mais pelo aceite de minha parte do que pelo convite propriamente. Fiquei me perguntando o que eu quero com isso e como fazer isso, pois não sei. Mas, lembrei-me que fazer sem saber faz parte da psicanálise e é topar isso que permite articular algum saber. É preciso, portanto, colher as conseqüências do ato.
Então, resolvi deixar o texto de Sílvia passar por mim e provocar efeitos que, em um segundo tempo, começaram a se tornar algumas construções articuladas a minha experiência na psicanálise e ao meu estudo dos textos de Freud e Lacan. Tentarei transmitir isso a vocês.
Quando nos propomos a uma aproximação com o ensino de Lacan, nos deparamos logo de cara com uma ênfase nos efeitos que a entrada no mundo da linguagem produz no homem. Porém, penso que isso só nos mostra a sua verdadeira dimensão no próprio percurso de uma análise.
Lacan nos mostra que, a princípio, o filhote humano é banhado pela linguagem, que ele recebe como uma cadeia sonora contínua e indiferenciada. Destaca-se nessa cadeia, para o bebê, uma sonoridade cativante da voz do Outro que não importa por aquilo que quer dizer, mas antes pelo próprio contínuo que embala. Esse bebê, como sabemos, não tarda em começar a gozar com a própria voz, emitindo uma sonoridade pura e ritmada que Lacan nomeou como lalíngua. Trata-se de uma língua que não comunica nada, que não está inserida em um sistema de oposições. Trata-se de um gozo fundamental, um gozo do ser vivo, que é primordial na constituição do sujeito.
Enquanto o bebê goza em lalíngua, o Outro faz recortes e colhe, nesse contínuo indiferenciado, um primeiro significante que se repete, o que inaugura uma marca de um sujeito. Vemos aí uma contenção do gozo, um limite traçado pela inserção em um código compartilhado. Nesse ponto de reviravolta, o balbuciar tagarelante se torna uma fala endereçada ao Outro e atinge uma outra forma de gozo, um gozo na linguagem. Encantado pelo lugar marcado que a repetição inaugurou para ele, o bebê entra no mundo do sentido ao abrir mão do sem-sentido de lalíngua. Ele escolhe a vida amputada de bolsa, uma vida em que há uma mortificação pelo significante.
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